5. Acreditar e esquecer para lembrar melhor | iN SAiO

Páginas de um diário de bordo do processo criativo de dança de Claudia Palma, Armando Aurich e Ana Mondini na iN SAiO cia. de Artes.

4. Presenças virtuais: tudo é e tudo está | iN SAiO


16 de fevereiro: Acreditar e esquecer para lembrar melhor

Depois da primeira reunião online com Ana Mondini, o que mais impressiona a todos é a confiança: mesmo em Portugal, Ana afirma que “não há distância” entre ela e o processo criativo de Claudia Palma e Armando Aurich. Por apresentar esse envolvimento quase transcendental, Ana acaba exigindo de Claudia e Armando uma postura semelhante, uma mesma fé nessa criação e comunicação à distância.

Sendo assim, já não se trata mais de discutir se essa obra de dança será fechada ou aberta, ou de planejar a maneira como Ana irá interferir nela quando chegar ao Brasil uma semana antes da apresentação do trabalho: trata-se de acreditar que ela está presente aqui tanto quanto ela acredita que eles estejam presentes lá. Em contato com essa sensibilidade que está além do imediatamente sensível, Armando recorda-se de Meta-sensoriais (2007), dançado por eles na Cia. 2 do Balé da Cidade. Claudia se lembra de sua experiência ministrando aulas online de eutonia, da sua capacidade de tocar o outro à distância por meio da voz: “que conexão é essa que a voz chega e toca?”.

Imagens cênicas vão surgindo. A imagem inicial de travessia junta-se hoje à de um portal, que se abre para ser atravessado tanto por quem dança quanto por quem assiste. Convidar quem assiste a trilhar esse caminho comum. Atravessá-lo com memórias, atravessar as memórias.

Como lidar coreograficamente com tantas memórias, com décadas de dança vivida no corpo? Há o risco de copiar, de querer citar coreografias, gestos e sons do passado. O que protege essa criação coreográfica da cópia e da citação deliberada é o esquecimento: não é retomar coreografias de memória, é retomar a memória das coreografias, utilizando a sabedoria do corpo para alcançar aquilo que, apesar da ação do tempo, permaneceu como essência.

Uma dessas essências é o corpo em instabilidade, em desequilíbrio, que foi vivido por Claudia e Armando nas coreografias de Ana Mondini.
Revisitar a instabilidade do corpo, portanto, é conectar-se com Ana. Esse movimento provém da mobilidade da coluna vertebral, que contrasta com a estabilidade dos pés, firmes no chão. Com essa corporalidade, Claudia e Armando fazem improvisos de travessia pelo espaço, e experimentam, por meio da força do olhar, estar convidando o público a trilhar junto.

O olhar conecta, e surge como um elemento cênico que faz do encontro entre Claudia, Armando e Ana (e o público) algo esteticamente concreto. O encontro transforma, e a questão seguinte é descobrir como fazer dessa transformação algo cenicamente observável, numa metamorfose que será humana e animal.


6. O sonho de Claudia | iN SAiO

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