Tramas rítmicas do jazz ao oriente em Caminho da Seda

De caminhos traçados, deslizados e desenrolados com mais de 400 metros de tecido, Caminho da Seda é uma obra do Raça cia. de dança que caminhou firme de 2001 até 2023 e, ao que tudo indica, seguirá caminhando adiante. Permeada por fortes tons de orientalismo, a obra retrata, em forma de dança, as trocas dinâmicas que por muitos séculos passaram pela Rota da Seda, que não eram somente comerciais mas também culturais, científicas e humanas entre Ásia, Oriente Médio, África e Europa.

Para estabelecer uma diálogo entre esse tempo passado e o tempo presente, a coreógrafa Roseli Rodrigues valeu-se do vocabulário do jazz dance, sua especialidade. É no jazz que se baseia todo o trabalho do Raça, que não é somente cênico mas também educacional, formando profissionais da dança há mais de quarenta anos. Não é por acaso, então, que a composição coreográfica de Caminho da Seda baseia-se em um fio de didática que tece toda a movimentação e facilita a apreciação, mesmo por leigos: o enrolar, desenrolar e deslizar dos corpos e dos tecidos.

Porém de que modo, exatamente, o jazz dance dialoga com o oriente? É um diálogo que acontece mais no campo da inspiração do que da técnica, e que parece ser mais fácil de justificar coreograficamente e musicalmente do que culturalmente. O compositor norte-americano John Cage diria que esse diálogo funciona porque jazz e dança oriental (a indiana, no texto de Cage) possuem estruturas rítmicas claras, e é no jogo entre ritmo musical e ritmo corporal que essas danças encontram suas maiores forças e sua longevidade.

Talvez a atenção viva ao ritmo seja uma das explicações para o sucesso de Caminho da Seda mesmo depois de mais de vinte anos de sua estreia. A obra foi indicada ao prêmio APCA de Espetáculo/Não estreia em 2021, e ainda hoje é aplaudida de um jeito que é comum no campo da ópera porém raro no campo da dança: ao final das cenas. Logo na primeira cena a trama rítmica de tecidos, corpos e sons e luzes é intensa e tão bem trabalhada que causa forte impacto: nela a música é um fio firme de sustentação que amarra todos os elementos e fortalece a dinâmica da cena. Deste modo, o Raça cia. de Dança mostra sua habilidade de tecer movimentos e sons, gerando finos tecidos que resistam à ação do tempo.


Caminho da Seda

Coreografia: Roseli Rodrigues

Músicas: “Yulunga (Spirit Dance)”, de Dead Can Dance; “Love Song”, de Ofra Haza; “O Caminho da Seda”, de Fabio Cardia

Figurino: Mauricio Pina e Roseli Rodrigues

Elenco: Alessandra Helena, Amanda Alabarce, Amanda Ferreira, Bruno Feliciano, Carolina Dezani, Evelyn Libanes, Fabricio Cestari, Gustavo Oliveira, Hygor Furquim, Jeferson Felix, João Marcos Dias, Lucas Maia, Milena Gabriela, Rebeca Janone e Thiago Araújo

Direção Geral: Renan Rodrigues
Direção Técnica: Marcel Rodrigues
Direção Executiva: Cristina Morales
Diretor de Produção: Fabrício Fonseca
Coordenador Artístico/Ensaiador: Gentil Sabino
Iluminação: Coletivo Proscênio
Produção Cultural: Transformare
Produção Técnica: Robson Fabiano

Crítica feita em colaboração com o fotógrafo Giorgio D’Onofrio.

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